excertos do olhar
5 de abril de 2010
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"Felizmente vou passando a vida com alegria
não me dá sede o currículo nem fome a filosofia."
Agostinho da Silva
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2 de abril de 2010
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"Há uma paz, uma serenidade que não sei de onde nasce. Qualquer coisa que se aproxima de uma resignação, de uma aceitação absoluta. Talvez porque tome consciência de que lá, onde quero chegar, não se chega com palavras, as palavras atrapalham o caminho. Que para chegar lá, a esse lugar tão harmonioso, preciso deixar as palavras atrás de mim, cala-las. Abandonando as palavras nas minhas costas, livro-me da sua inerente ambiguidade, penetro numa zona onde não há verdade nem mentira, onde a dúvida avassaladora deixa de me perturbar. A verdade e a mentira só vivem nas palavras que eu digo sobre as coisas não nas coisas. Não sei se será disto que nasce uma paz, uma serenidade quando olho, como agora, para o que vejo sem qualquer vontade de compreender, simplesmente maravilhado porque algo se expõe infinitamente à minha frente."
Pedro Paixão - Portokyoto
28 de fevereiro de 2010
e chega-se assim_____________________
e chego no tempo certo das magnólias em flor.
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_______________que de incerto é todo tempo lá fora. ruidoso e tóxico.
Estão todos nus. os lobos e os cordeiro____tudo por uma túnica sem sudário.
que nos valha.
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_______________que de incerto é todo tempo lá fora. ruidoso e tóxico.
Estão todos nus. os lobos e os cordeiro____tudo por uma túnica sem sudário.
que nos valha.
3 de fevereiro de 2010
31 de janeiro de 2010
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_________demasiada luz ou demasiada sombra são como nevoeiros. não nos deixam ver para lá do branco ou do preto________.
Hoje é domingo... . O céu tem o azul que só o céu tem, não o de uma superfície mas o de uma distância. Tudo podia ser um sonho, tudo podia ser outra coisa, uma ilusão fugaz e passageira. São vários os estratos da realidade e por vezes confundem-se, confundindo-nos.
... Hoje é domingo. Podíamos fazer alguma coisa, mas o melhor talvez seja não fazermos nada e ficarmos estendidos na cama. Deus, deixa-nos sossegar.
... É como se o mundo se refizesse, porventura
renascesse, uma última vez. Temos faltas, feridas,
sofrimentos que precisam de ser abençoados por nós, por
outros ou por um deus. Chega-nos um imperativo desejo de
nos tornarmos mais dignos. O mundo fica um pouco
melhor, quando nos tornamos melhores.
renascesse, uma última vez. Temos faltas, feridas,
sofrimentos que precisam de ser abençoados por nós, por
outros ou por um deus. Chega-nos um imperativo desejo de
nos tornarmos mais dignos. O mundo fica um pouco
melhor, quando nos tornamos melhores.
Pedro Paixão in a cidade depois
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23 de janeiro de 2010
Ocaso_______.
"À hora do ocaso assaltam-nos as memórias do dia, incertos olhamos a ameaça da noite. É a hora da "meditação", do regresso a nós próprios, porque estamos agora nós próprios naquilo que meditamos. O gesto que se cumpre arremessa-nos de nós ou leva-nos com ele tão totalmente, que nada fica para o pensarmos, o discutirmos. É o gesto da "inautenticidade" ou do tempo em que éramos por inteiro. Mas justamente é sobretudo hoje que se poder ser inautêntico, ou seja, dividido, porque é sobretudo hoje o tempo da divisão. Só poderíamos ser unos, se houvesse o que nos unificasse. Mas às formas mais imperiosas da evidência nós submetemo-las hoje à pergunta que separa, à dúvida que destotaliza. E esse é, aliás, o sinal da sua morte. Porque a vida primacialmente "é", e a morte é o que se analisa."
Vergílio Ferreira, in Invocação ao meu corpo - XVII, Na hora técnica
6 de janeiro de 2010
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o "rio" da minha aldeia
já só é exuberante com as chuvas do inverno
de resto é uma ténue linha de vida presa por um fio.
já só é exuberante com as chuvas do inverno
de resto é uma ténue linha de vida presa por um fio.
Reza a História que alimentou muitos campos para muitas bocas da cidade grande. Que foi aldeia de cantares das mulheres da roupa branca.
Que deu de beber aos animais e aos homens que aqui passavam, outros que daqui saiam, para irem construir o "memorial do Convento".
E muitas histórias mais que fazem a história deste lugar da "zona saloia" de Lisboa.
Agora, nos campos que a alimentaram nascem vivendas de luxo, ao ritmo com que as águas das chuvas descem o Cabeço de Montachique num inverno tão chuvoso como este.
Que deu de beber aos animais e aos homens que aqui passavam, outros que daqui saiam, para irem construir o "memorial do Convento".
E muitas histórias mais que fazem a história deste lugar da "zona saloia" de Lisboa.
Agora, nos campos que a alimentaram nascem vivendas de luxo, ao ritmo com que as águas das chuvas descem o Cabeço de Montachique num inverno tão chuvoso como este.
estamos demasiado ocupados para escutar
somos demasiado barulhentos para ouvir o que quer que seja,
senão a nossa insensatez.
somos demasiado barulhentos para ouvir o que quer que seja,
senão a nossa insensatez.
Pedro Paixão
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Agradeço os votos de bom ano que aqui tiveram a gentileza de me deixar.
Para todas vós um grande beijo__________de gratidão
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Para todas vós um grande beijo__________de gratidão
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28 de dezembro de 2009
17 de dezembro de 2009
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A todos os amigos e amigas desejo-vos um Santo e Feliz Natal.
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Todos os dias são natal por isso deixo-vos um Pequeno Gesto
que mudará a vida de uma criança/jovem e o futuro de um País.
....em Moçambique são quase 600 mil os orfãos da sida.
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15 de dezembro de 2009
9 de dezembro de 2009
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não quero voo noutra direcção que não seja a do coração. pacífico. sereno e amoroso. nem voos em nevoeiros. cegos. que distorcem a distancia e aprisionam as asas. aqui a terra é pousio. pouso tecido de frutos de sementes de ternura e porta aberta.
_______ um azulejo à entrada. de sabedoria. antiga__________!
_______ um azulejo à entrada. de sabedoria. antiga__________!
4 de dezembro de 2009
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(...)Contento-me com a minha cela ter vidraças por dentro das grades, e escrevo nos vidros, no pó do necessário, o meu nome em letras grandes, assinatura quotidiana da minha escritura com a morte. Com a morte? Não, nem com a morte. Quem vive como eu não morre: acaba, murcha, desvegeta-se. O lugar onde esteve fica sem ele ali estar, a rua por onde andava fica sem ele lá ser visto, a casa onde morava é habitada por não ele.
É tudo, e chamamos-lhe o nada: mas nem essa tragédia da negação podemos representar com aplauso, pois nem ao certo sabemos se é nada, vegetais da verdade como da vida, pó que tanto está por dentro como por fora das vidraças, netos do Destino e enteados de Deus, que casou com a Noite Eterna quando ela enviuvou do Caos que nos procriou.
É tudo, e chamamos-lhe o nada: mas nem essa tragédia da negação podemos representar com aplauso, pois nem ao certo sabemos se é nada, vegetais da verdade como da vida, pó que tanto está por dentro como por fora das vidraças, netos do Destino e enteados de Deus, que casou com a Noite Eterna quando ela enviuvou do Caos que nos procriou.
Fernando Pessoa in Livro do desassossego.
primavera de destroços_________
«Tu disseste Quero saborear o infinito
Eu disse A frescura das maçãs matinais revela-nos segredos insondáveis
Tu disseste Sentir a aragem que balança os dependurados
Eu disse É o medo o que nos vem acariciar
Tu disseste Eu também já tive medo. Muito medo. Recusava-me a abrir a janela, a transpôr o limiar da porta
Eu disse Acabamos a gostar do medo,do arrepio que nos suspende a fala
Tu disseste Um dia fiquei sem nada. um mundo inteiro por descobrir
Eu disse ...
Eu disse O que é que isso interessa?
Tu disseste ..nada
Tu disseste Agora procuro o desígnio da vida. Às vezes penso encontrá-lo num bater de asas, num murmúrio trazido pelo vento, no piscar de um néon. Escrevo páginas e páginas a tentar formalizá-lo. Depois queimo tudo e prossigo a minha busca
Eu disse Eu não faço nada. Fico horas a olhar para uma mancha na parede
Tu disseste E nunca sentiste a mancha a alastrar, as suas formas num palpitar quase imperceptível?
Eu disse Não. A mancha continua no mesmo sítio, eu continuo a olhar para ela e não se passa nada
Tu disseste E no entanto a mancha alastra e toma conta de ti. Liberta-te do corpo. Tu é que não vês
Eu disse O que é que isso interessa?
Tu disseste ..nada
Eu disse O que é que isso interessa?
Adolfo Luxúria Canibal
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30 de novembro de 2009
Cepti-cidade
.ante câmara.
à espera de uma texto estava outro texto. nas possibilidades abstractas da premonição dos encontros.
há números vivos e a matemática da alma anda por todo o lado.
de qualquer modo o resultado das somas normalmente é imperceptível aos olhos alheios da equação.
O sentido das coisas têm um só sentido para quem sente e o corpo é inquilino apenas. muitas vezes estrangeiro._____ a racionalidade é abstracta e incerta. enquanto conceito em linha recta. enquanto a exclusão dos números vivos.
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há números vivos e a matemática da alma anda por todo o lado.
de qualquer modo o resultado das somas normalmente é imperceptível aos olhos alheios da equação.
O sentido das coisas têm um só sentido para quem sente e o corpo é inquilino apenas. muitas vezes estrangeiro._____ a racionalidade é abstracta e incerta. enquanto conceito em linha recta. enquanto a exclusão dos números vivos.
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Fumar um cigarro entre duas dificuldades como se fossem dedos
Fernando Lemos in Teclado Universal
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Gostei. Ontem Fernando Lemos no Câmara Clara
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25 de novembro de 2009
do Amor______
19 de novembro de 2009
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A jovem camponesa que faz versos.
Não os passa ao papel porque não sabe escrever,
mas diz que os preserva em cada árvore que vê,
e na chuva que cai,
e no sol que se põe.
Uma pequena erva pode ser um poema,
ou a água que corre no leito de um ribeiro
onde uma luz se esconde ou uma sombra vibra.
Como cuidar da imperfeição
senão sofrendo pelo que é perfeito?
Às vezes – diz ela -, passa-me pela cabeça
uma onda de música que não tem lugar
e eu sei pertencer a um mistério sem nome
que dói no coração muito devagar.
Amadeu Baptista in O bosque cintilante
Não os passa ao papel porque não sabe escrever,
mas diz que os preserva em cada árvore que vê,
e na chuva que cai,
e no sol que se põe.
Uma pequena erva pode ser um poema,
ou a água que corre no leito de um ribeiro
onde uma luz se esconde ou uma sombra vibra.
Como cuidar da imperfeição
senão sofrendo pelo que é perfeito?
Às vezes – diz ela -, passa-me pela cabeça
uma onda de música que não tem lugar
e eu sei pertencer a um mistério sem nome
que dói no coração muito devagar.
Amadeu Baptista in O bosque cintilante
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16 de novembro de 2009
uma facada nas costas...
O ti Agosto e a D. Maria são o casal cuidadores da quintinha há já muitos anos. A D. Maria, senhora de 79 anos e em muito boa forma, é daquelas mulheres que nunca estão bem com a vida... os outros são todos imperfeitos, os jovens uns malandros que não querem trabalhar, etc, etc. Árida de afectos, não gosta de cães nem de gatos mas gosta de manjericos e de galinhas garnizé. Ai de quem se queixe de alguma dor na sua frente, despeja logo o seu rosário de doenças cortando de imediato o diálogo, passando para o seu eterno monólogo, numa verdadeira excursão desde a primeira até à última dor.
O ti Augusto é um homem bom. Tudo está sempre bem com ele. É generoso, afectuoso, bonacheirão, calmo, gosta de pessoas e de animais, da natureza, de brincos de princesa e de ver o "gordo" na televisão. Homem de 84 anos há três foi operado ao coração, depois de um enfarte. Nunca deixou de vir um só dia ver a quinta. Entristecia-o vê-la abandonada, ou quase, mas um ano depois já tudo estava como dantes.
A D. Maria é muito rezingona com ele, de fazer perder a paciência a um santo. Tudo o que o ti Augusto faça está mal feito e o que não faça também. Por isso ele gosta mais de vir sozinho, sem a "velha a atazanar-me o juízo" como costuma dizer. Mas, há um "ponto" que o tira do sério: as ferramentas nunca estarem no lugar onde as guarda.
A faca! A faca nunca está no seu lugar. A D. Maria serve-se dela mas deixa-a em qualquer lado esquecendo-se onde, e o ti Augusto vê-se sempre "grego" para a encontrar.
Um dia destes o ti Augusto "passou-se dos carretos". Queria cortar umas couves para as galinhas e não achava a bendita faca. Depois de andar mais de uma hora à procura dela por tudo quanto é sítio, diz-lhe a mulher da cozinha que dá serventia ao quintal: Ó gusto a faca está aquiiii, enquanto se abeirava da abertura da sebe que dá para a horta, brandindo a faca no ar.
O ti Augusto, estica-se todo agarrado a uma couve para não se desequilibrar, pega na faca e num gesto desesperado, espeta-lhe a faca nas costas...
- Agora ficas aqui!
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O ti Augusto é um homem bom. Tudo está sempre bem com ele. É generoso, afectuoso, bonacheirão, calmo, gosta de pessoas e de animais, da natureza, de brincos de princesa e de ver o "gordo" na televisão. Homem de 84 anos há três foi operado ao coração, depois de um enfarte. Nunca deixou de vir um só dia ver a quinta. Entristecia-o vê-la abandonada, ou quase, mas um ano depois já tudo estava como dantes.
A D. Maria é muito rezingona com ele, de fazer perder a paciência a um santo. Tudo o que o ti Augusto faça está mal feito e o que não faça também. Por isso ele gosta mais de vir sozinho, sem a "velha a atazanar-me o juízo" como costuma dizer. Mas, há um "ponto" que o tira do sério: as ferramentas nunca estarem no lugar onde as guarda.
A faca! A faca nunca está no seu lugar. A D. Maria serve-se dela mas deixa-a em qualquer lado esquecendo-se onde, e o ti Augusto vê-se sempre "grego" para a encontrar.
Um dia destes o ti Augusto "passou-se dos carretos". Queria cortar umas couves para as galinhas e não achava a bendita faca. Depois de andar mais de uma hora à procura dela por tudo quanto é sítio, diz-lhe a mulher da cozinha que dá serventia ao quintal: Ó gusto a faca está aquiiii, enquanto se abeirava da abertura da sebe que dá para a horta, brandindo a faca no ar.
O ti Augusto, estica-se todo agarrado a uma couve para não se desequilibrar, pega na faca e num gesto desesperado, espeta-lhe a faca nas costas...
- Agora ficas aqui!
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13 de novembro de 2009
...e o peso deste verde que me oprime!________
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Meu corpo, meu corpo.
Meu corpo, meu corpo.
Companheiro de longos anos, não foi fácil acomodar-mo-nos um ao outro. Porque eu queria tudo o que era da vida, na plenitude do meu ser, a alegria até à exaustão, o prazer até onde o houvesse, e a resistência até onde os outros resistiam. Mas tu tinhas um regulamento especial só para mim, com direitos limitados e uma infindável lista de deveres que eu não sabia senão quando já tinha prevaricado e me aplicavas o castigo irremediável e me obrigavas a pagar com juros dobrados...Assim aprendi duramente a lição do desprendimento, da separação, fechado comigo, na intimidade resignada e severa, se pudesse ser, envelhecendo antes da hora, preparado talvez a tempo para quando a hora chegasse, tratando a vida com delicadeza das mãos que seguram e não prendem para que não houvesse roubo quando ma roubassem, amando intensamente sem amar, para que a crueldade não fosse demais, (...)
Vergílio Ferreira in Invocação ao meu corpo
__________um Dia havemos nascer sem corpo.
A tragédia principal da minha vida é, como todas as
tragédias, uma ironia do Destino. Repugno a vida real como
uma condenação; repugno o sonho como uma libertação ignóbil.
Mas vivo o mais sórdido e o mais quotidiano da vida
real; e vivo o mais intenso e o mais constante do sonho. Sou
como um escravo que se embebeda à sesta — duas misérias
em um corpo só.
Fernando Pessoa in Livro do desassossego
uma condenação; repugno o sonho como uma libertação ignóbil.
Mas vivo o mais sórdido e o mais quotidiano da vida
real; e vivo o mais intenso e o mais constante do sonho. Sou
como um escravo que se embebeda à sesta — duas misérias
em um corpo só.
Fernando Pessoa in Livro do desassossego
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