4 de dezembro de 2009

primavera de destroços_________



«Tu disseste Quero saborear o infinito
Eu disse A frescura das maçãs matinais revela-nos segredos insondáveis
Tu disseste Sentir a aragem que balança os dependurados
Eu disse É o medo o que nos vem acariciar
Tu disseste Eu também já tive medo. Muito medo. Recusava-me a abrir a janela, a transpôr o limiar da porta
Eu disse Acabamos a gostar do medo,do arrepio que nos suspende a fala
Tu disseste Um dia fiquei sem nada. um mundo inteiro por descobrir
Eu disse ...

Eu disse O que é que isso interessa?
Tu disseste ..nada

Tu disseste Agora procuro o desígnio da vida. Às vezes penso encontrá-lo num bater de asas, num murmúrio trazido pelo vento, no piscar de um néon. Escrevo páginas e páginas a tentar formalizá-lo. Depois queimo tudo e prossigo a minha busca
Eu disse Eu não faço nada. Fico horas a olhar para uma mancha na parede
Tu disseste E nunca sentiste a mancha a alastrar, as suas formas num palpitar quase imperceptível?
Eu disse Não. A mancha continua no mesmo sítio, eu continuo a olhar para ela e não se passa nada
Tu disseste E no entanto a mancha alastra e toma conta de ti. Liberta-te do corpo. Tu é que não vês
Eu disse O que é que isso interessa?
Tu disseste ..nada

Eu disse O que é que isso interessa?
Tu disseste ..nada»

Adolfo Luxúria Canibal
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